A escola

Sabendo da importância crucial que os primeiros anos de vida têm no desenvolvimento de uma pessoa, uma pergunta óbvia vem à tona: qual é a educação mais adequada que uma escola de educação infantil pode oferecer? 

Antigamente os filhos ficavam em casa com os pais, com a mãe mais comumente, até a idade de ir para a escola, o que ocorria em torno dos 7 anos de vida. Os tempos mudaram, as pressões econômicas e sociais aumentaram, e hoje ambos os pais têm de trabalhar fora. Assim, o comum é uma criança ir para alguma instituição de educação já a partir dos primeiros meses de vida. Na prática, a criança passa boa parte do seu dia aos cuidados das escolas de educação infantil. É natural que queiramos saber qual o melhor tipo de escola para que nossos filhos se desenvolvam de forma saudável.


Pois bem, em minha prática educacional tenho visto cada vez mais uma ênfase desmedida no desempenho acadêmico das crianças. Quem tem filhos em escolas que adotam certos sistemas de ensino sabe que eles são submetidos a 3 provas por semana já nas séries do ensino fundamental 1. Que, ao procurar uma escola de ensino fundamental para o filho, esta aplica “avaliações” do “nível” da criança, para determinar se ela tem “competências” adequadas ao ritmo da escola! Que nível? Que competências? Quase todos acadêmicos! O que isso significa? Que bons alunos são os que estão adequados a determinados padrões de conhecimento acadêmico: como eles sabem ler e escrever, como sabem classificar, que fatos conhecem, como sabem contar, etc. Muitos pais avaliam a qualidade da educação infantil baseado nestes parâmetros. 


Será que crianças expostas muito cedo a ambientes fortemente acadêmicos se desenvolvem mais e melhor que outras crianças?

David Elkind, psicólogo infantil e professor da universidade Tufts nos EUA, demonstrou preocupação a este respeito, argumentando que esta pressão cada vez maior sobre o desempenho acadêmico de crianças pré-escolares pode deixá-las sem tempo para ser criança. E mais, elas podem perder o interesse e o gosto pela aprendizagem. Vários estudos, entre eles o de Marcon et al. (1999), corroboram esta visão. Vejamos.

Crianças de 3 a 6 anos que frequentavam pré-escolas com foco acadêmico demonstraram de início mais competência acadêmica básica, como reconhecer letra e leitura básica. No entanto, elas perdem estas competências ao final do ensino infantil. Além disso, elas se demonstraram menos criativas, mais estressadas e mais ansiosas em relação às provas, menos confiantes, menos orgulhosas e menos entusiasmadas do que as crianças que frequentavam pré-escolas onde as práticas didáticas eram voltadas para atividades sociais centradas nas crianças, flexíveis e com base na autodescoberta. Crianças que estudaram em pré-escolas baseadas nas iniciativas próprias das crianças demonstraram ao final do ciclo maior domínio das competências básicas do que as crianças das escolas que enfatizavam atividades acadêmicas. Como resumiu Marcon:

“O sucesso escolar posterior das crianças parece ser reforçado por experiências de aprendizagem mais ativas e baseadas nas iniciativas das crianças. O progresso a longo prazo pode ser retardado por experiências acadêmicas pré-escolares excessivas, que apresentam experiências de aprendizagem formais cedo demais para o nível de desenvolvimento das crianças. Forçar crianças cedo demais [em competências acadêmicas, em detrimento da autodescoberta] é uma prática que pode realmente sair pela culatra. Pois quando as crianças tiverem de ir para as séries do ensino fundamental,  serão obrigadas a pensar de forma mais independente e assumir maior responsabilidade pela sua própria aprendizagem.”


Ou seja, pré-escolas que balanceiam de forma saudável brincadeiras e aprendizagem por meio da autodescoberta mostraram-se mais benéficas do que as centradas em conhecimentos acadêmicos e habilidades pré-determinadas a serem ensinadas. Isso nos faz pensar muito, não? Como são as práticas do dia-a-dia na escola do seu filho? Podemos usar estas descobertas quando formos escolher uma nova escola? De que maneira?


Comentários

  1. Lendo esse texto lembrei de mim mesma quando iniciei a escola, uma menina de 7 anos totalmente inserida num contexto acadêmico controlado pela ditadura militar. Não lembro de nada relativo a criatividade nesse período escolar, até os desenhos eram limitados a uma vez por semana, às sextas feiras e sempre com temas definidos pelo professor.
    Fico feliz que hoje com mais liberdade em nosso país possamos estimular criatividade, sinto que os pais de minha idade ainda são os acorrentados da expressão pessoal.

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